André Øvredal fez sua estreia como diretor em 2010 com “O Caçador de Trolls”, mas somente em 2016 seu nome ganharia os holofotes com o lançamento do subversivo e aclamado terror “A Autópsia”. Com sua competente filmografia, ficamos animados para o lançamento da adaptação cinematográfica de “Histórias Assustadoras para Contar no Escuro” (2019) – ainda mais levando em consideração que Guillermo del Toro ficaria responsável pelo roteiro e produção.
A inquestionável competência do time criativo era o principal elemento para transformar um conhecido e convencional conto de terror – nesse caso, vários contos – em um tour-de-force mais profundo do que prometia, analisando perspectivas interessantes e ao mesmo tempo envolventes o suficiente para entregar sua premissa principal (uma aventura sobrenatural e aterrorizante focada em adolescentes inconsequentes).
Afinal, Del Toro levou para casa o Oscar de Melhor Filme por sua belíssima obra “A Forma da Água” (2017), além de ter trabalhado com criaturas fantásticas na franquia “Hellboy” (2004); partindo desse pensamento, explorar monstros terríveis seria uma tarefa fácil, mas o resultado não se restringiu a originalidade interessante, cedendo a diversas saídas clichês para buscar um pouco de dinamismo e acidez em diálogos curtos.

É claro que não podemos tirar mérito da dupla em questão na cautela estética imprimida, mas o restante se desenrola de forma artificial demais para apreciação até dos menos céticos. Algumas sequências são de tirar o fôlego e de nos arrepiar dos pés à cabeça, mas certas construções não passam de fillers excessivos e que, na verdade, não contribuem muito para o prosseguimento da história principal. Mesmo com deslizes claros, o resultado final é agradável o suficiente para desconcertar o público, além de sutilmente confirmar uma sequência que tem tudo para ser melhor que a obra original.
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Baseado no aclamado livro de contos de Alvin Schwartz, a trama é ambientada nos final de 1960 e gira em torno de um grupo de adolescentes que, durante a noite de Halloween, ficam presos em uma casa mal-assombrada e desenterram um intrigante livro de contos escrito por Sarah, uma das últimas sobreviventes da família Bellows que foi removida de todas as fotos do lugar. A escritora amadora obcecada pelo terror Stella (Zoe Colletti), acaba levando o livro consigo e desencadeia pesadelos inimagináveis controlados pela própria Sarah do além-vida: na verdade.
O compilado de histórias ganha vida e começa a atacar cada um dos jovens da pequena cidade, não pensando duas vezes antes de transformar seus medos mais profundos em realidade.

A ideia é simples de ser compreendida e parte de uma perspectiva ingênua e amadurecida ao mesmo tempo – uma típica brincadeira paradoxal já presente em diversas obras de Del Toro. Øvredal traz em sua breve importância para a indústria cinematográfica uma condução invejável que não se respalda apenas nos saturados jump-scares, mas sim abre espaço para a explicitação imagética; não é surpresa que os monstros, ainda que apareçam em uma atmosfera literalmente escura, sejam pensados de cabo a rabo para nos assustar com suas feições distorcidas e que habitam o mais profundo dos nossos sonhos – seja pelo espantalho que mata o valentão Tommy (Austin Abrams), seja pela Dama Pálida que assombra o irreverente Chuck (Austin Zajur).
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Entretanto, não podemos deixar de notar que certos aspectos complicam o desejo do cineasta em buscar essa perspectiva original da qual já falamos, principalmente quando se isola em apenas um arco narrativo. São poucos os momentos que os protagonistas e coadjuvantes desenvolvem suas personalidades para além do horror que os persegue. No primeiro ato, a relação instantânea que surge entre Stella e Ramón (Michael Garza) passa quase nenhuma credibilidade para o público e é recuperada apenas nos momentos finais, como se os blocos em questão estivessem alheios ao restante dos trágicos acontecimentos.

Felizmente, as construções de terror conseguem falar mais alto do que os equívocos do longa-metragem e se respaldam em um agonizante intimismo psicológico que não se importa em sacrificar suas personas ou deixá-las à beira da insanidade. Até mesmo a fotografia ousa sair um pouco da zona de conforto, apesar de eventualmente se valer de alguns elementos clichês presentes nas obras do gênero.
“Histórias Assustadoras para Contar no Escuro” (2019) é uma boa produção, mas poderia ser melhor. O esforço que faz para construir algo metalinguístico e dar vida a alguns dos demônios mais horripilantes da cultura pop, é notável, mesmo insurgindo em detrimento de um cuidado narrativo maior. É bem provável que o filme ganhe uma continuação e, desta vez, esperemos que Øvredal e Del Toro estejam ainda mais preparados.
“Histórias Assustadoras para Contar no Escuro” estreia em 8 de agosto de 2019.
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