Star Wars está em um novo caminho. This is the way, como diriam as vozes abafadas das celebridades mandalorianas. Isso tudo, claro, não seria possível sem o gosto amargo que “A Ascensão Skywalker” (2019) deixou na boca dos fãs e que obrigou a Disney a remediar e replanejar toda a sua estratégia. Isso sendo bem gentil, porque sabemos que não havia estratégia alguma.
Mas hoje nós conseguimos enxergar isso. Conseguimos compreender a jornada e as apostas erradas: o “Episódio IV 2.0”; o Star Wars mais divisivo existente; a tentativa de levar o fim a ser um “Episódio VI 2.0”, e que fracassou miseravelmente. Vendo essa estrutura, vendo as decisões administrativas – começa JJ, segue Ryan, batem a cara na parede ofendendo os fãs mais saudosistas e voltam arrependidos aos braços do primeiro, sem qualquer aviso prévio, que é obrigado a concluir as próprias Mistery Boxes. Favor lembrar de não deixar que façam isso de novo.
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Pra deixar claro: sou da metade (?) que gostou de “Os Últimos Jedi” (2017) desde o lançamento. A expectativa era alta e só fui ver o filme pedindo por uma coisa: que Luke e Kylo Ren estivessem em seu máximo. E eles estavam. Talvez hoje, em que o filme realmente pode ser olhado e compreendido como um meio de caminho, o fandom de Star Wars esteja reinterpretando esse segundo filme. Digo isso pois tenho visto uma boa parcela de pessoas afirmando que antes não gostavam, mas hoje enxergam esse filme de uma forma mais positiva. Sim, é um artigo baseado em pura perspectiva e, caso a sua seja diferente, adoraria saber.
Erros Imperdoáveis

Primeiramente, gostar do filme não o faz perfeito. Ele ser melhor recebido não apaga suas falhas, como o segundo ato arrastado e algumas Disneyzadas como “Hungs”, Finn caminhando com uma bolsa de água vazada e outros exemplos. Humor de Star Wars sempre é esperado, e ele já veio de formas muito cafonas pelas câmeras do George Lucas, mas a Disney tem sua fórmula comercial de fazer humor. Muitas vezes ficamos anestesiados em outras franquias, mas talvez por pesar a mão muito forte e isso atrapalhar o roteiro – como transformar um representante autoritário e ameaçador da Primeira Ordem em um palhaço – gera uma reação muito pior pro filme.
Além disso, alguns dos erros são causados por mal desenvolvimento. É o caso do arco da Rose e do Finn, que vão do nada ao nada. Há quem discuta sobre o arco do Poe, mas é minimamente mais interessante do que o primeiro, apesar de que poderia ser resolvido na conversa. Direto na cultura pop vemos personagens que não conversam, mas na maioria das vezes há pelo menos um ou dois motivos que expliquem a ausência de diálogo.
Nesse filme temos de apenas supor uma arrogância e orgulho vindos da Holdo, o que torna estranho ela jogar tudo nas mãos do Poe, que é tratado como “o piloto ultrapassado” que quer resolver tudo com tiros de X-Wing. A mensagem de que há outras formas mais estratégicas e menos autodestrutivas de lidar com o exército inimigo é interessante; a ideia de apresentar a zona cinza da galáxia com os lordes lucrando com as armas é interessante; a ideia de “salvar o que amamos, não destruir o que odiamos” também é interessante; mas todos esses argumentos trouxeram o máximo de contextos errados possível.
Novos caminhos – e uns nem tão novos

No filme, se destacam algumas escolhas ousadas para os personagens, principalmente no que tange o elenco da Força. O primeiro mais notável é o da queda de Luke Skywalker, que surpreendeu muita gente. O fandom trazia consigo a idealização máxima do personagem, como um Superman pro universo de Star Wars, mas o roteiro é claro, taxativo e coerente na sua decisão: Luke não se isolaria com um mapa só possivelmente completo pelo R2 desligado sem motivo. Não iria embora se planejasse voltar.
É o que vimos acontecer com Yoda e Obi-Wan: o primeiro falha em derrotar Sidious e se isola em Dagobah, sabendo que eventualmente treinaria um novo Skywalker; já Kenobi é quem traria Luke à luz no momento certo. Luke, contudo, não trazia a mesma esperança: ele reergueu a República com sua família e achou que a mesma era infindável, caindo bem debaixo do seu nariz (por causa justamente da napa do Adam Driver). Além disso, os jedi já caíram no passado e tanto Yoda quanto Obi-Wan tinham quem esperar. Luke, não. Era hora dos jedi acabarem.
Concomitante a isso, era hora de os velhos Sith também acabarem e Kylo traiu seu mestre (que depois descobrimos da pior forma possível ser o velho Palpatine…), tornando-se o então Líder Supremo da Primeira Ordem. Ele fez o que Vader jamais fez em vida, matando seu mestre por ambição e dando sequência ao ciclo de poder do lado sombrio. A velha fórmula de um vilão genérico por trás do cavaleiro negro ameaçador não funcionaria novamente, e por bem ela tinha sido acabada sem mais nem menos. Uma pena ser outra coisa que o nono filme covardemente remedia…
E não fosse pelo Palpatine, Rey teria seu espaço reservado como alguém que veio do nada. Que descobriu a força consigo e, sem parentesco importante ou qualquer coisa relevante pra galáxia, surgiu pra salvar o caminho da luz e se juntar à Resistência. Concordo que a notícia não é dada da melhor forma, afinal o filme teve de fazer duas médias: a metalinguagem de contar pra Rey que seus pais não eram ninguém no sentido de serem catadores que não se importaram com ela e para o público que ela não era filha de ninguém que as teorias falavam.
Johnson não teve como voltar atrás do hype criado por JJ, então ele só frustrou o mesmo. Por mais que eu acredite que a ideia funcione, entendo a decepção de tantos. Mas convenhamos, ainda assim, que era melhor não ter voltado atrás no terceiro filme dizendo “ãhn… na verdade ela era filha de alguém sim, tá legal? E esse alguém por acaso é filho do Imperador”. Uma pena que os melhores desenvolvimentos do filme tenham sido perdidos por retcons covardes.
Poderia ter acabado bem…

Por fim, o filme surfou e sofreu na onda da falta de planejamento da Disney. Em um primeiro momento, tomou seus riscos e poderia ir para onde quisesse com esses personagens. Já no segundo, olhando pra trás, JJ voltou pra jogar tudo pro alto e transformar o fim da saga em um “Retorno de Jedi” piorado. Temos de admitir que o pior problema dessa trilogia foi ter se tornado uma batalha entre dois diretores e dois lados dos fãs, e ver um caminho onde o material novo tenha uma recepção muito mais unanimamente boa – ou unanimamente ruim, no caso do EP IX – já demonstra uma evolução nessa polarização que aconteceu com a saga nos últimos anos. Parabéns a Dave Filoni e Jon Fraveau pelo ato.
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Ainda assim, a expectativa para o EP IX era alta. Kylo com poder máximo e talvez irredimível – por ir mais longe e mais longe se livrando dos protagonistas antigos -, Rey superando os dramas e conflitos antigos que a acompanhavam, aprendendo sozinha através dos livros sagrados (apesar de o retcon da Leia com treinamento ser relativamente aceitável) e a história olhando pra frente, sem mais ser refém do passado. Talvez esse fosse o maior mérito do segundo filme da franquia, no seu esforço de entregar novos caminhos a esses personagens e que, no fim, ficaram presos nas velhas fórmulas que funcionaram na primeira, mas não funcionam na segunda.
Esse artigo é tardio, pois felizmente estamos encarando uma nova fase, que finalmente explora questões novas para o universo da saga; inclusive com muito acontecendo na telinha em vez da telona, e é bom que no mínimo essa trilogia tenha servido de aprendizado pra quem achava que a marca seria vendável só com o uso de nostalgia barata. Inclusive, nada era mais do que esperado do que aqueles que não querem mais nem saber de Rey Palpatine e voltam seus olhos a Din Djarin e Grogu.
E você? Quais as suas impressões, hoje, sobre esses filmes?
“Os Últimos Jedi”, bem como toda a saga Star Wars, está disponível no Disney+.
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